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sexta-feira, 15 de janeiro de 2021

O caos das incertezas amargas

Certo dia, um daqueles, de ir e vir onde minha locomoção é Uber, entrei em um, e como falante que sou, meu bom dia sempre tem entonação de um continuar a prosa, o senhor que dirigia me levando para algum lugar que já não lembro, me disse algo que ficou em meu pensamento, disse ele: “2020 é o ano que queremos esquecer para sempre, e para sempre nunca iremos esquecer”.  Fiquei pensando naquelas palavras e olhando pela janela enquanto paisagens passavam por mim, indagando os porquês de esquecer 2020...

Penso que datas são inesquecíveis, subjetivas para cada ser, algumas queremos lembrar para todo sempre, como um nascimento, o conhecimento, o amor, a paixão e o florescer de abundâncias. Mas tem as datas que queremos esquecer pois lembra morte, amargor, ansiedade, desilusão e medos, aí está o nó, cuidando para não viver os traumas do receio do medo vivido. 

O que difere lembrar 2020, é o medo coletivo, o mundo entrou no caos das incertezas amargas e certezas de muitos funerais.  As ruas esvaziaram, o silêncio tomou conta, as bocas se calaram abafadas atrás de máscaras, a camuflagem do medo, onde a única nudez está nos olhos, amedrontados. Veio a ansiedade, o desespero de ficar em casa, a angústia de suportar o outro e muitas vezes suportar a si mesmo. As paredes tornaram-se espelhos gigantes, e olhar para dentro é assustador, machuca e até mata, há quem não suportou. 

Pandemia....miando, sussurrando por todos os cantos, amedrontando. Na mídia, corpos mortos, amontoamento, famílias chorando, nem funeral, nem despedida. Findou.

Pandemia... o olhar para o outro, o cuidado com nossos entes, o medo da perda.

Pandemia.... do descaso da saúde pública, nem respirava mais, vivia por aparelhos...eis a pandemia, o Brasil de joelhos, heróis vestidos de branco, o SUS renasceu. 

Pandemia....há quem diga em energia, dizem que o mundo implorou por mais humanidade, compaixão e reciprocidade, mas digo ao mundo, que muitos não vão entender, tem doenças que não tem cura. Sevcenko escreveu “No loop da montanha russa” sendo assim a massa consumista e capitalista parece doença maligna. Cazuza cantou para os miseráveis que vagam pelo mundo derrotados e disse mais, que muitas piscinas estão cheias de ratos, e vimos assim tantas discrepâncias de falta de sensibilidade e ganância. Renato Russo sempre gritou: “que país é esse”, então está tudo bem? Não. Só a vacina não basta. Sinto muito.

Em todas as datas, anos ou séculos, vivenciamos a falta, a ganância e a não reciprocidade, e o mundo sempre vai agir, a natureza vai reagir e nós seres humanos muito pouco absorvemos o porquê de existir e ser para si e para o outro.

Pandemia é o olhar para o espelho, o que sou para que sou e estou, “ser mais dentro”, a pandemia nos extraiu de fora e nos pôs para dentro, literalmente para dentro de casa, raiz, estrutura, resta saber o que vamos aprender com tudo isso e quando as portas se abrirem e sorrisos se amostrarem de novo, antes escondidos por panos enfeitados. 

Pandemia... há quem que não se protegeu, se aglomerou e culpou a tirania do poder e até achou que era uma “ gripezinha”, a arrogância ou até mesmo a corda bamba de bêbados equilibristas, sobriedade não existe. 

Tantas reflexões em uma simples frase de um senhor motorista, e tantas indagações pairam aqui ainda, e sinto em pensar, que muito pouco se aprendeu e a nova data tão esperada, essa chamada 2021, pouco vai nos dar, se não escutarmos o que a pandemia 2020 veio no falar. 


Simone Bitencourt